INTRODUÇÃO
A salvação é a grande oportunidade oferecida por Deus à humanidade através da graça. Em aceitar Jesus Cristo, nós somos chamados filhos de Deus e, ser filho, é pertencer a uma família, com direito a um nome, um lar e um futuro. Aprenderemos com o apóstolo João que Deus é o provedor e que Jesus é o autor da tão maravilhosa graça salvadora.
Leitura em Classe (1Jo 3.1-5; Rm 8.14-17)
1Jo 3.1-5
“Vede quão grande caridade nos tem concedido o Pai” (v.1). O apóstolo João mostra sua admiração pela graça que é a origem de uma dádiva tão maravilhosa. Ou seja, observai quão grande amor nos tem concedido o Pai: “que fôssemos chamados filhos de Deus”. Quem recebe o Filho Jesus, torna-se também filho de Deus (Jo 1.12). O Pai eterno mostra um amor maravilhoso ao adotar pessoas como nós, que por natureza, somos herdeiros do pecado, da culpa e do juízo de Deus; nós que pela prática somos filhos da corrupção, da desobediência e da ingratidão! O Deus santo não se envergonha de ser chamado de nosso Pai e de nos chamar de seus filhos, “por isso” (ou por esse motivo), porque “o mundo não nos conhece” e “não conhece a Ele”. João coloca a honra dos crentes acima do reconhecimento do mundo. Enquanto o mundo quase não conhece a verdadeira alegria que os genuínos seguires de Cristo sentem, vivem expostos às calamidades comuns da terra e do tempo, sujeitos às aflições desta vida, sem esperança; mas nós, embora às vezes pobres, modestos e menosprezados somos protegidos do céu e brevemente habitaremos lá!
OBS.: O mundo não lembra que uma grande pessoa residiu nesta terra; sim, o Criador habitou nela. Os judeus não perceberam que o Deus de Abraão, Isaque e Jacó era um dos seus habitantes em seu próprio país. Ele veio aos seus e os seus não o receberam (Jo 1.11), mas, certamente, se o conhecessem “nunca crucificariam ao Senhor da glória” (1Co 2.8).
“Amados, agora somos filhos de Deus” (v.2). Chamados de “amados” por João, os discípulos tinham a natureza de filhos pela regeneração: temos o título, o espírito e o direito à herança dos filhos pela adoção (Sl 149.9).
“...ainda não é manifesto o que havemos de ser” (v.2). A glória pertencente à filiação e adoção é adiada e reservada para outro mundo. Os filhos de Deus precisam andar pela fé e viver pela esperança. O tempo da revelação dos filhos de Deus em seu estado e glória próprios ocorrerá quando seu irmão mais velho vier para chamar e reunir a todos:
“Mas sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele; porque assim como é o veremos” (v.2). Isso faz lembrar a promessa em João 14.3 “virei outra vez e vos levarei para mim mesmo, para que, onde eu estiver, estejais vós também”. Quando a Cabeça da igreja, o Filho unigênito do Pai, aparecer, os seus membros, os adotados de Deus, aparecerão e serão manifestados juntamente com Ele. Podemos então esperar na fé, esperança e desejo intenso, pela revelação do Senhor Jesus; assim como também a criação aguarda pela sua perfeição e “...a manifestação dos filhos de Deus” (Rm 8.19). Os filhos de Deus serão semelhantes a Jesus em honra, poder, e glória. Seus corpos desprezíveis serão feitos como o corpo glorioso de Jesus Cristo; serão preenchidos com vida, luz e bem-aventurança a partir dele (leia Cl 3.4).
“E qualquer que nele tem esta esperança purifica-se a si mesmo, como também ele é puro” (v.3). O apóstolo ressalta o compromisso dos filhos de Deus na continuidade da santificação. Sabemos que nosso Senhor é santo e puro; aqueles que esperam viver com Ele precisam buscar a maior pureza possível, afastando-se do mundo, da carne e do pecado; precisam crescer na graça e na santidade, pois a esperança em alcançar o céu nos forçará a fazer assim. Além de sermos santificados pela fé, somos também santificados pela esperança.
Depois de falar sobre a obrigação do crente para com a pureza da sua esperança em relação ao céu e a comunhão com Cristo em glória no dia da sua aparição, João agora prossegue no sentido de encher a mente dos crentes com múltiplos argumentos contra o pecado:
“Qualquer que comete o pecado também comete iniqüidade; porque o pecado é iniqüidade” (v.4). O pecado é contrário à lei divina. Cometer iniqüidade é transgredir essa lei (é ilegal). O pecado é a destituição ou a privação da harmonia e conformidade com a lei divina. A concretização do pecado agora é a rejeição da lei divina, que é a rejeição da autoridade divina e, consequentemente, do próprio Deus.
“E bem sabeis que ele se manifestou para tirar os nossos pecados; e nele não há pecado” (v.5). O plano e missão do Senhor Jesus Cristo no mundo e para o mundo, era para remover os pecados.
Rm 8.14-17
“Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus” (v.14). Semelhante a um estudante, que em sua aprendizagem é guiado por seu professor, como um viajante, que em sua viagem é orientado por seu guia, como um soldado, quem em combate é dirigido por seu capitão, assim são os que em Cristo se submetem pela fé à sua orientação, em obediência, são levados a toda verdade e à total submissão. Eles são “os filhos de Deus” por adoção, reconhecidos e amados por Ele.
“Porque não recebestes o espírito de escravidão, para, outra vez, estardes em temor...” (v.15). O espírito de escravidão refere-se à dispensação que estava o povo do Antigo Testamento, por causa das trevas e do terror daquele período. O véu significava escravidão (2Co 3.15,17). O espírito de adoção não estava plenamente derramado como agora, pois a lei abriu a ferida, mas proporcionou remédio insuficiente para ela. Então vós não estais naquela dispensação, não recebeste aquele espírito.
“...mas recebestes o Espírito de adoção de filhos, pelo qual clamamos: Aba, Pai.” Quando Deus adota alguém, dá-lhe um espírito de adoção – a natureza de filhos. Aba, Pai, é uma oração clamorosa, o que não é apenas uma expressão séria, mas natural de desejo; uma criança que não pode falar desabafa seus desejos chorando. Agora, o Espírito nos ensina a nos achegar, em oração, a Deus como a um Pai, com uma santa e humilde confiança, incentivando a alma nessa tarefa. “Aba” é uma palavra siríaca que significa “pai” ou “meu pai” e “pater” é uma palavra grega; e por que ambas, Aba e Pai? Porque Cristo disse assim na oração (Mc 14.36): “Aba, Pai”, e temos recebido o Espírito do Filho.
“O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus” (v.16). Os que são santificados têm o Espírito de Deus testemunhando com seus espíritos, o que não deve ser entendido como revelação extraordinária imediata, mas como uma obra habitual do Espírito, em e por meio do consolo, falando de paz para a alma.
“E, se nós somos filhos, somos, logo, herdeiros também, herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo” (v.17). Aqui, o apóstolo Paulo fala sobre os privilégios dos crentes, é a parte nobre da nossa felicidade, a saber, um direito à glória futura. A nossa filiação, como adoção de filhos, nos dá o direito àquela glória, assim a disposição de filhos nos ajusta e prepara para ela. Nas heranças terrenas essa regra não se mantém, sendo apenas aos primogênitos os herdeiros, mas a igreja é uma igreja de primogênitos, pois todos eles são herdeiros. O céu é uma herança de que todos os santos são herdeiros.
OBS.: “Herdeiros de Deus” (Sl 16.5-6; Nm 18.20; ap 21.3); “co-herdeiros de Cristo” (Hb 1.2; Ap 21.7; Jo 17.24; Ap 3.21). A glória futura é a recompensa dos sofrimentos presentes e a realidade das esperanças do presente.
“... se é certo que com ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados” (v.17). O estado da igreja neste mundo sempre é, e era especialmente naquela época, um estado de angústia. Ser um cristão certamente era ser um sofredor. Então, para consolá-los em relação àqueles sofrimentos, ele lhes fala que eles sofriam com Cristo – por sua causa, por sua honra, pelo testemunho de uma boa consciência, e deveriam ser glorificados com Ele (ver 2Tm 2.12), leia Rm 8.18.
I - A ADOÇÃO DO CRENTE
A palavra grega traduzida como adoção (huiothesia), significa “colocar na posição de filho”. Somente ocorre cinco vezes nas Escrituras, e todas elas nos escritos de Paulo: Rm 8.15, 23; 9.4; Gl 4.5; Ef 1.5.
- O tempo da adoção. Nos conselhos de Deus, foi um ato no passado eterno (Ef 1.5). Antes mesmo de começar a raça hebraica, sim, antes da criação, Ele nos predestinou para esta posição (Hb 11.39-40). Na experiência pessoal ela se torna verdadeira para o crente na hora em que ele aceita a Jesus Cristo (Gl 3.26). Mas a percepção plena da filiação aguarda a vinda de Cristo. É naquela hora que a adoção será plenamente consumada (Rm 8.23). Então, nossos corpos serão libertos da corrupção e da mortalidade e se tornarão semelhantes ao corpo glorioso de Cristo (Fl 3.20-21).
II - O QUE CONSTITUI A SALVAÇÃO?
Três aspectos que caracterizam a salvação:
a) Justificação: faz lembrar um tribunal: o homem culpado e condenado, perante Deus, é absolvido e declarado justo (justificado) ver 2Co 5.21;
b) Regeneração: sugere uma cena familiar: a alma morta em transgressões e ofensas, precisa de uma nova vida, e esta vida é lhe concedida por um ato divino de adoção. Torna-se herdeira de Deus e membro de sua família (2Co 5.17);
c) Santificação: Esta palavra faz lembrar o templo, pois relaciona-se com o culto a Deus. A pessoa, depois de ter sido declarado justo e recebido uma nova vida, dessa hora em diante, dedica-se ao serviço de Deus (1Co 1.30).
OBS.: O homem salvo, portanto, consiste em ser justificado, regenerado e santificado. Sendo justificado ele pertence aos justos; sendo regenerado ele é filho de Deus; sendo santificado ele é “santo”, ou seja, separado. Essas três experiências constituem na plena salvação, que são três princípios de vida cristã em direção à perfeição.
III - CONDIÇÕES DA SALVAÇÃO
Deus exige do homem ARREPENDIMENTO e FÉ; abandonar o pecado e buscar a Deus são as condições e os preparativos para a salvação.
- Fé (crer, confiar, ver Rm 10.9) é o instrumento pelo qual recebemos a salvação, fato que não se dá com o arrependimento.
- Arrependimento – ocupa-se com o pecado e o remorso. O arrependimento é a verdadeira tristeza sobre o pecado, incluindo um esforço sincero para abandoná-lo (2Co 7.10).
IV – A SEGURANÇA DA SALVAÇÃO
Nesse ponto, vamos considerar se a salvação final dos cristãos é incondicional ou poderá perder-se por causa do pecado.
“Desviar-se” é o termo usado para indicar uma pessoa que “caiu temporariamente da graça”. O desviado é uma pessoa que outrora tinha zelo de Deus, mas agora se tornou fria (Mt 24.12), outrora obedecia à Palavra, mas o mundanismo e o pecado impediram seu crescimento e frutificação (Mat. 13:22); outrora pôs a mão ao arado, mas olhou para trás (Luc. 9:62); como a esposa de Ló, que havia sido resgatada da cidade da destruição, mas seu coração voltou para ali (Luc. 17:32); outrora estava em contacto vital com Cristo, mas agora está fora de contacto, e está seco, estéril e inútil espiritualmente (João 15:6); outrora obedecia à voz da consciência, mas agora jogou para longe de si essa bússola que o guiava, e, como resultado, sua embarcação de fé destroçou-se nas rochas do pecado e do mundanismo (1 Tim. 1:19); outrora alegrava-se em chamar-se cristão, mas agora se envergonha de confessar a seu Senhor (2 Tim. 1:8 ;2:12); outrora estava liberto da contaminação do mundo, mas agora voltou como a "porca lavada ao espoja-douro de lama" (2 Ped. 2:22; vide Luc. 11:21-26).
É possível decair da graça; mas a questão é saber se a pessoa que era salva e teve esse lapso, pode finalmente perder-se. Existem dois sistemas doutrinários: o calvinista responde que não; o arminiano (chamado assim em razão de Armínio, teólogo holandês, que trouxe a questão a debate) responde que sim. Vejamos:
[1] Calvinismo - A salvação é inteiramente de Deus; o homem absolutamente nada tem a ver com sua salvação. Se ele, o homem, se arrepender, crer e for a Cristo, é inteiramente por causa do poder atrativo do Espírito de Deus. Isso se deve ao fato de que a vontade do homem se corrompeu tanto desde a queda, que, sem a ajuda de Deus, não pode nem se arrepender, nem crer, nem escolher corretamente.
Naturalmente surge esta pergunta: Se a salvação é inteiramente obra de Deus, e o homem não tem nada a ver com ela, e está desamparado, amenos que o Espírito de Deus opere nele, então, por que Deus não salva a todos os homens, posto que todos estão perdidos e desamparados? A resposta de Calvino era: Deus predestinou alguns para serem salvos e outros para serem perdidos. "A predestinação é o eterno decreto de Deus, pelo qual ele decidiu o que será de cada um e de todos os indivíduos. Pois nem todos são criados na mesma condição; mas a vida eterna está preordenada para alguns, e a condenação eterna para outros."
Dessa doutrina da predestinação segue-se o ensino de "uma vez salvo sempre salvo"; porque se Deus predestinou um homem para a salvação, e unicamente pode ser salvo e guardado pela graça de Deus, que é irresistível, então, nunca pode perder-se. Os defensores da doutrina da "segurança eterna" apresentam as seguintes referências para sustentar sua posição: João 10:28,29: Rom. 11:29; Fil. 1:6; 1 Ped. 1:5; Rom. 8:35; João 17:6.
[2] Arminianismo - A vontade de Deus é que todos os homens sejam salvos, porque Cristo morreu por todos. (1 Tim. 2:4-6; Heb. 2:9; 2 Cor. 5:14; Tito 2:11,12.) Com essa finalidade ele oferece sua graça a todos. Embora a salvação seja obra de Deus, absolutamente livre e independente de nossas boas obras ou méritos, o homem tem certas condições a cumprir. Ele pode escolher aceitar a graça de Deus, ou pode resistir-lhe e rejeitá-la. Seu direito de livre arbítrio sempre permanece.
As Escrituras certamente ensinam uma predestinação, mas não que Deus predestina alguns para a vida eterna e outros para o sofrimento eterno. Ele predestina " a todos os que querem" a serem salvos — e esse plano é bastante amplo para incluir a todos que realmente desejam ser salvos.
Deus, em razão de seu conhecimento, previu que essas pessoas aceitariam o evangelho e permaneceriam salvos, e predestinou para essas pessoas uma herança celestial. Ele previu o destino delas, mas não o fixou.
V – A SALVAÇÃO É CONDICIONAL OU INCONDICIONAL?
Uma vez salva, a pessoa é salva eternamente? A resposta dependerá da maneira em que podemos responder às seguintes perguntas-chave: De quem depende a salvação? É irresistível a graça?
a) De quem depende, em última análise, a salvação? de Deus ou do homem? Certamente deve depender de Deus, porque, quem poderia ser salvo se a salvação dependesse da força da própria pessoa? Podemos estar seguros disto: Deus nos conduzirá à vitória, não importa quão débeis ou desatinados sejamos, uma vez que sinceramente desejamos fazer a sua vontade. Sua graça está sempre presente para nos admoestar, reprimir, animar e sustentar.
Contudo, não haverá um sentido em que a salvação dependa do homem? As Escrituras ensinam constantemente que o homem tem o poder de escolher livremente entre a vida e a morte, e Deus nunca violará esse poder.
b) Pode-se resistir à graça de Deus? Um dos princípios fundamentais do Calvinismo é que a graça de Deus e irresistível. Quando Deus decreta a salvação de uma pessoa, seu Espírito atrai, e essa atração não pode ser resistida. Portanto, um verdadeiro filho de Deus certamente perseverará até ao fim e será salvo; ainda que caia em pecado, Deus o castigará e pelejará com ele. Ilustrando a teoria calvinista diríamos: é como se alguém estivesse a bordo dum navio, e levasse um tombo; contudo está a bordo ainda; não caiu ao mar.
Mas o Novo Testamento ensina, sim, que é possível resistir à graça divina e resistir para a perdição eterna (Jo 6.40; Hb 6.6; 10.26-30; 2Pe 2.21; Hb 2.3; 2Pe 1.10), e que a perseverança é condicional dependendo de manter-se em contacto com Deus.
Note-se especialmente Hb 6.4-6 e 10.26-29. Essas palavras foram dirigidas a cristãos; as epístolas de Paulo não foram dirigidas aos não-regenerados. Aqueles aos quais foram dirigidas são descritos como havendo sido uma vez iluminados, havendo provado o dom celestial, participantes do Espírito Santo, havendo provado a boa Palavra de Deus e as virtudes do século futuro. Essas palavras certamente descrevem pessoas regeneradas.
Aqueles aos quais foram dirigidas essas palavras eram critãos hebreus, que, desanimados e perseguidos (10.32-39), estavam tentados a voltar ao Judaísmo. Antes de serem novamente recebidos na sinagoga, requeria-se deles que, publicamente, fizessem as seguintes declarações (10.29): que Jesus não era o Filho de Deus; que seu sangue havia sido derramado justamente como o dum malfeitor comum; e que seus milagres foram operados pelo poder do maligno. Tudo isso está implícito em Hb 10.29.
Antes de sua conversão havia pertencido à nação que crucificou a Cristo; voltar à sinagoga seria de novo crucificar o Filho de Deus e expô-lo ao vitupério; seria o terrível pecado da apostasia (Heb. 6.6); seria como o pecado imperdoável para o qual não há remissão, porque a pessoa que está endurecida a ponto de cometê-lo não pode ser "renovada para arrependimento"; seria digna dum castigo mais terrível do que a morte (10.28); e significaria incorrer na vingança do Deus vivo (10.30, 31).
VI - O EQUILÍBRIO EVITA OS EXTREMOS
Quando duas doutrinas bíblicas são colocadas em posição antagônica (oposta), uma contra a outra, o resultado é uma reação que conduz ao erro. Por exemplo: a ênfase demasiada à soberania e à graça de Deus na salvação pode conduzir a uma vida descuidada, porque se a pessoa é ensinada a crer que conduta e atitude nada têm a ver com sua salvação, pode tornar-se negligente. Por outro lado, ênfase demasiada sobre a livre vontade e responsabilidade do homem, como reação contra o Calvinismo, pode trazer as pessoas sob o jugo do legalismo e despojá-las de toda a confiança de sua salvação. Os dois extremos que devem ser evitados são: a ilegalidade e o legalismo.
- É inevitável defrontarmo-nos com mistérios quando nos propomos tratar as poderosas verdades da presciência de Deus e a livre vontade do homem; mas se guardamos as exortações práticas das Escrituras, e nos dedicamos a cumprir os deveres específicos que se nos ordenam, não erraremos. "As coisas encobertas são para o Senhor Deus, porém as reveladas são para nós" (Dt 29.29).
O Novo Testamento ensina uma verdadeira "segurança eterna", assegurando-nos que, a despeito da debilidade, das imperfeições, obstáculos ou dificuldades exteriores, o cristão pode estar seguro e ser vencedor em Cristo. Ele pode dizer com o apóstolo Paulo: "Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, ou a angústia, ou a perseguição ou a fome, ou a nudez, ou o perigo, ou a espada? Como está escrito: Por amor de ti somos entregues à morte todo o dia; fomos reputados como ovelhas para o matadouro. Mas em todas estas coisas somos mais do que vencedores, por aquele que nos amou. Porque estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor" (Rom. 8.35-39).
CONCLUSÃO
Faz alguns anos, um ministro escocês, um verdadeiro homem de Deus, se inclinou no púlpito, no início do seu sermão e disse em tom solene:
– Meus amigos, tenho uma pergunta a fazer-lhes. Eu não posso respondê-la e nem tampouco vocês. Nem um anjo do Céu, nem o diabo a responderia.
Um silêncio fúnebre reinou na congregação. Todos os olhares fixavam-se no pastor, que prosseguiu, dizendo:
– A pergunta é esta: "Como escaparemos, se rejeitamos tão grande salvação?" - C. H. Spurgeon.
HENRY, Matthew. Comentário Novo Testamento, CPAD.
PEARLMAN, Myer. Conhecendo as Doutrinas da Bíblia – Editora Vida, 2006.
THIESSEN, Henry Clarence. Palestra em Teologia Sistemática, Ed. Batista Regular. São Paulo, 1997.
A salvação é a grande oportunidade oferecida por Deus à humanidade através da graça. Em aceitar Jesus Cristo, nós somos chamados filhos de Deus e, ser filho, é pertencer a uma família, com direito a um nome, um lar e um futuro. Aprenderemos com o apóstolo João que Deus é o provedor e que Jesus é o autor da tão maravilhosa graça salvadora.
Leitura em Classe (1Jo 3.1-5; Rm 8.14-17)
1Jo 3.1-5
“Vede quão grande caridade nos tem concedido o Pai” (v.1). O apóstolo João mostra sua admiração pela graça que é a origem de uma dádiva tão maravilhosa. Ou seja, observai quão grande amor nos tem concedido o Pai: “que fôssemos chamados filhos de Deus”. Quem recebe o Filho Jesus, torna-se também filho de Deus (Jo 1.12). O Pai eterno mostra um amor maravilhoso ao adotar pessoas como nós, que por natureza, somos herdeiros do pecado, da culpa e do juízo de Deus; nós que pela prática somos filhos da corrupção, da desobediência e da ingratidão! O Deus santo não se envergonha de ser chamado de nosso Pai e de nos chamar de seus filhos, “por isso” (ou por esse motivo), porque “o mundo não nos conhece” e “não conhece a Ele”. João coloca a honra dos crentes acima do reconhecimento do mundo. Enquanto o mundo quase não conhece a verdadeira alegria que os genuínos seguires de Cristo sentem, vivem expostos às calamidades comuns da terra e do tempo, sujeitos às aflições desta vida, sem esperança; mas nós, embora às vezes pobres, modestos e menosprezados somos protegidos do céu e brevemente habitaremos lá!
OBS.: O mundo não lembra que uma grande pessoa residiu nesta terra; sim, o Criador habitou nela. Os judeus não perceberam que o Deus de Abraão, Isaque e Jacó era um dos seus habitantes em seu próprio país. Ele veio aos seus e os seus não o receberam (Jo 1.11), mas, certamente, se o conhecessem “nunca crucificariam ao Senhor da glória” (1Co 2.8).
“Amados, agora somos filhos de Deus” (v.2). Chamados de “amados” por João, os discípulos tinham a natureza de filhos pela regeneração: temos o título, o espírito e o direito à herança dos filhos pela adoção (Sl 149.9).
“...ainda não é manifesto o que havemos de ser” (v.2). A glória pertencente à filiação e adoção é adiada e reservada para outro mundo. Os filhos de Deus precisam andar pela fé e viver pela esperança. O tempo da revelação dos filhos de Deus em seu estado e glória próprios ocorrerá quando seu irmão mais velho vier para chamar e reunir a todos:
“Mas sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele; porque assim como é o veremos” (v.2). Isso faz lembrar a promessa em João 14.3 “virei outra vez e vos levarei para mim mesmo, para que, onde eu estiver, estejais vós também”. Quando a Cabeça da igreja, o Filho unigênito do Pai, aparecer, os seus membros, os adotados de Deus, aparecerão e serão manifestados juntamente com Ele. Podemos então esperar na fé, esperança e desejo intenso, pela revelação do Senhor Jesus; assim como também a criação aguarda pela sua perfeição e “...a manifestação dos filhos de Deus” (Rm 8.19). Os filhos de Deus serão semelhantes a Jesus em honra, poder, e glória. Seus corpos desprezíveis serão feitos como o corpo glorioso de Jesus Cristo; serão preenchidos com vida, luz e bem-aventurança a partir dele (leia Cl 3.4).
“E qualquer que nele tem esta esperança purifica-se a si mesmo, como também ele é puro” (v.3). O apóstolo ressalta o compromisso dos filhos de Deus na continuidade da santificação. Sabemos que nosso Senhor é santo e puro; aqueles que esperam viver com Ele precisam buscar a maior pureza possível, afastando-se do mundo, da carne e do pecado; precisam crescer na graça e na santidade, pois a esperança em alcançar o céu nos forçará a fazer assim. Além de sermos santificados pela fé, somos também santificados pela esperança.
Depois de falar sobre a obrigação do crente para com a pureza da sua esperança em relação ao céu e a comunhão com Cristo em glória no dia da sua aparição, João agora prossegue no sentido de encher a mente dos crentes com múltiplos argumentos contra o pecado:
“Qualquer que comete o pecado também comete iniqüidade; porque o pecado é iniqüidade” (v.4). O pecado é contrário à lei divina. Cometer iniqüidade é transgredir essa lei (é ilegal). O pecado é a destituição ou a privação da harmonia e conformidade com a lei divina. A concretização do pecado agora é a rejeição da lei divina, que é a rejeição da autoridade divina e, consequentemente, do próprio Deus.
“E bem sabeis que ele se manifestou para tirar os nossos pecados; e nele não há pecado” (v.5). O plano e missão do Senhor Jesus Cristo no mundo e para o mundo, era para remover os pecados.
Rm 8.14-17
“Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus” (v.14). Semelhante a um estudante, que em sua aprendizagem é guiado por seu professor, como um viajante, que em sua viagem é orientado por seu guia, como um soldado, quem em combate é dirigido por seu capitão, assim são os que em Cristo se submetem pela fé à sua orientação, em obediência, são levados a toda verdade e à total submissão. Eles são “os filhos de Deus” por adoção, reconhecidos e amados por Ele.
“Porque não recebestes o espírito de escravidão, para, outra vez, estardes em temor...” (v.15). O espírito de escravidão refere-se à dispensação que estava o povo do Antigo Testamento, por causa das trevas e do terror daquele período. O véu significava escravidão (2Co 3.15,17). O espírito de adoção não estava plenamente derramado como agora, pois a lei abriu a ferida, mas proporcionou remédio insuficiente para ela. Então vós não estais naquela dispensação, não recebeste aquele espírito.
“...mas recebestes o Espírito de adoção de filhos, pelo qual clamamos: Aba, Pai.” Quando Deus adota alguém, dá-lhe um espírito de adoção – a natureza de filhos. Aba, Pai, é uma oração clamorosa, o que não é apenas uma expressão séria, mas natural de desejo; uma criança que não pode falar desabafa seus desejos chorando. Agora, o Espírito nos ensina a nos achegar, em oração, a Deus como a um Pai, com uma santa e humilde confiança, incentivando a alma nessa tarefa. “Aba” é uma palavra siríaca que significa “pai” ou “meu pai” e “pater” é uma palavra grega; e por que ambas, Aba e Pai? Porque Cristo disse assim na oração (Mc 14.36): “Aba, Pai”, e temos recebido o Espírito do Filho.
“O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus” (v.16). Os que são santificados têm o Espírito de Deus testemunhando com seus espíritos, o que não deve ser entendido como revelação extraordinária imediata, mas como uma obra habitual do Espírito, em e por meio do consolo, falando de paz para a alma.
“E, se nós somos filhos, somos, logo, herdeiros também, herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo” (v.17). Aqui, o apóstolo Paulo fala sobre os privilégios dos crentes, é a parte nobre da nossa felicidade, a saber, um direito à glória futura. A nossa filiação, como adoção de filhos, nos dá o direito àquela glória, assim a disposição de filhos nos ajusta e prepara para ela. Nas heranças terrenas essa regra não se mantém, sendo apenas aos primogênitos os herdeiros, mas a igreja é uma igreja de primogênitos, pois todos eles são herdeiros. O céu é uma herança de que todos os santos são herdeiros.
OBS.: “Herdeiros de Deus” (Sl 16.5-6; Nm 18.20; ap 21.3); “co-herdeiros de Cristo” (Hb 1.2; Ap 21.7; Jo 17.24; Ap 3.21). A glória futura é a recompensa dos sofrimentos presentes e a realidade das esperanças do presente.
“... se é certo que com ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados” (v.17). O estado da igreja neste mundo sempre é, e era especialmente naquela época, um estado de angústia. Ser um cristão certamente era ser um sofredor. Então, para consolá-los em relação àqueles sofrimentos, ele lhes fala que eles sofriam com Cristo – por sua causa, por sua honra, pelo testemunho de uma boa consciência, e deveriam ser glorificados com Ele (ver 2Tm 2.12), leia Rm 8.18.
I - A ADOÇÃO DO CRENTE
A palavra grega traduzida como adoção (huiothesia), significa “colocar na posição de filho”. Somente ocorre cinco vezes nas Escrituras, e todas elas nos escritos de Paulo: Rm 8.15, 23; 9.4; Gl 4.5; Ef 1.5.
- O tempo da adoção. Nos conselhos de Deus, foi um ato no passado eterno (Ef 1.5). Antes mesmo de começar a raça hebraica, sim, antes da criação, Ele nos predestinou para esta posição (Hb 11.39-40). Na experiência pessoal ela se torna verdadeira para o crente na hora em que ele aceita a Jesus Cristo (Gl 3.26). Mas a percepção plena da filiação aguarda a vinda de Cristo. É naquela hora que a adoção será plenamente consumada (Rm 8.23). Então, nossos corpos serão libertos da corrupção e da mortalidade e se tornarão semelhantes ao corpo glorioso de Cristo (Fl 3.20-21).
II - O QUE CONSTITUI A SALVAÇÃO?
Três aspectos que caracterizam a salvação:
a) Justificação: faz lembrar um tribunal: o homem culpado e condenado, perante Deus, é absolvido e declarado justo (justificado) ver 2Co 5.21;
b) Regeneração: sugere uma cena familiar: a alma morta em transgressões e ofensas, precisa de uma nova vida, e esta vida é lhe concedida por um ato divino de adoção. Torna-se herdeira de Deus e membro de sua família (2Co 5.17);
c) Santificação: Esta palavra faz lembrar o templo, pois relaciona-se com o culto a Deus. A pessoa, depois de ter sido declarado justo e recebido uma nova vida, dessa hora em diante, dedica-se ao serviço de Deus (1Co 1.30).
OBS.: O homem salvo, portanto, consiste em ser justificado, regenerado e santificado. Sendo justificado ele pertence aos justos; sendo regenerado ele é filho de Deus; sendo santificado ele é “santo”, ou seja, separado. Essas três experiências constituem na plena salvação, que são três princípios de vida cristã em direção à perfeição.
III - CONDIÇÕES DA SALVAÇÃO
Deus exige do homem ARREPENDIMENTO e FÉ; abandonar o pecado e buscar a Deus são as condições e os preparativos para a salvação.
- Fé (crer, confiar, ver Rm 10.9) é o instrumento pelo qual recebemos a salvação, fato que não se dá com o arrependimento.
- Arrependimento – ocupa-se com o pecado e o remorso. O arrependimento é a verdadeira tristeza sobre o pecado, incluindo um esforço sincero para abandoná-lo (2Co 7.10).
IV – A SEGURANÇA DA SALVAÇÃO
Nesse ponto, vamos considerar se a salvação final dos cristãos é incondicional ou poderá perder-se por causa do pecado.
“Desviar-se” é o termo usado para indicar uma pessoa que “caiu temporariamente da graça”. O desviado é uma pessoa que outrora tinha zelo de Deus, mas agora se tornou fria (Mt 24.12), outrora obedecia à Palavra, mas o mundanismo e o pecado impediram seu crescimento e frutificação (Mat. 13:22); outrora pôs a mão ao arado, mas olhou para trás (Luc. 9:62); como a esposa de Ló, que havia sido resgatada da cidade da destruição, mas seu coração voltou para ali (Luc. 17:32); outrora estava em contacto vital com Cristo, mas agora está fora de contacto, e está seco, estéril e inútil espiritualmente (João 15:6); outrora obedecia à voz da consciência, mas agora jogou para longe de si essa bússola que o guiava, e, como resultado, sua embarcação de fé destroçou-se nas rochas do pecado e do mundanismo (1 Tim. 1:19); outrora alegrava-se em chamar-se cristão, mas agora se envergonha de confessar a seu Senhor (2 Tim. 1:8 ;2:12); outrora estava liberto da contaminação do mundo, mas agora voltou como a "porca lavada ao espoja-douro de lama" (2 Ped. 2:22; vide Luc. 11:21-26).
É possível decair da graça; mas a questão é saber se a pessoa que era salva e teve esse lapso, pode finalmente perder-se. Existem dois sistemas doutrinários: o calvinista responde que não; o arminiano (chamado assim em razão de Armínio, teólogo holandês, que trouxe a questão a debate) responde que sim. Vejamos:
[1] Calvinismo - A salvação é inteiramente de Deus; o homem absolutamente nada tem a ver com sua salvação. Se ele, o homem, se arrepender, crer e for a Cristo, é inteiramente por causa do poder atrativo do Espírito de Deus. Isso se deve ao fato de que a vontade do homem se corrompeu tanto desde a queda, que, sem a ajuda de Deus, não pode nem se arrepender, nem crer, nem escolher corretamente.
Naturalmente surge esta pergunta: Se a salvação é inteiramente obra de Deus, e o homem não tem nada a ver com ela, e está desamparado, amenos que o Espírito de Deus opere nele, então, por que Deus não salva a todos os homens, posto que todos estão perdidos e desamparados? A resposta de Calvino era: Deus predestinou alguns para serem salvos e outros para serem perdidos. "A predestinação é o eterno decreto de Deus, pelo qual ele decidiu o que será de cada um e de todos os indivíduos. Pois nem todos são criados na mesma condição; mas a vida eterna está preordenada para alguns, e a condenação eterna para outros."
Dessa doutrina da predestinação segue-se o ensino de "uma vez salvo sempre salvo"; porque se Deus predestinou um homem para a salvação, e unicamente pode ser salvo e guardado pela graça de Deus, que é irresistível, então, nunca pode perder-se. Os defensores da doutrina da "segurança eterna" apresentam as seguintes referências para sustentar sua posição: João 10:28,29: Rom. 11:29; Fil. 1:6; 1 Ped. 1:5; Rom. 8:35; João 17:6.
[2] Arminianismo - A vontade de Deus é que todos os homens sejam salvos, porque Cristo morreu por todos. (1 Tim. 2:4-6; Heb. 2:9; 2 Cor. 5:14; Tito 2:11,12.) Com essa finalidade ele oferece sua graça a todos. Embora a salvação seja obra de Deus, absolutamente livre e independente de nossas boas obras ou méritos, o homem tem certas condições a cumprir. Ele pode escolher aceitar a graça de Deus, ou pode resistir-lhe e rejeitá-la. Seu direito de livre arbítrio sempre permanece.
As Escrituras certamente ensinam uma predestinação, mas não que Deus predestina alguns para a vida eterna e outros para o sofrimento eterno. Ele predestina " a todos os que querem" a serem salvos — e esse plano é bastante amplo para incluir a todos que realmente desejam ser salvos.
Deus, em razão de seu conhecimento, previu que essas pessoas aceitariam o evangelho e permaneceriam salvos, e predestinou para essas pessoas uma herança celestial. Ele previu o destino delas, mas não o fixou.
V – A SALVAÇÃO É CONDICIONAL OU INCONDICIONAL?
Uma vez salva, a pessoa é salva eternamente? A resposta dependerá da maneira em que podemos responder às seguintes perguntas-chave: De quem depende a salvação? É irresistível a graça?
a) De quem depende, em última análise, a salvação? de Deus ou do homem? Certamente deve depender de Deus, porque, quem poderia ser salvo se a salvação dependesse da força da própria pessoa? Podemos estar seguros disto: Deus nos conduzirá à vitória, não importa quão débeis ou desatinados sejamos, uma vez que sinceramente desejamos fazer a sua vontade. Sua graça está sempre presente para nos admoestar, reprimir, animar e sustentar.
Contudo, não haverá um sentido em que a salvação dependa do homem? As Escrituras ensinam constantemente que o homem tem o poder de escolher livremente entre a vida e a morte, e Deus nunca violará esse poder.
b) Pode-se resistir à graça de Deus? Um dos princípios fundamentais do Calvinismo é que a graça de Deus e irresistível. Quando Deus decreta a salvação de uma pessoa, seu Espírito atrai, e essa atração não pode ser resistida. Portanto, um verdadeiro filho de Deus certamente perseverará até ao fim e será salvo; ainda que caia em pecado, Deus o castigará e pelejará com ele. Ilustrando a teoria calvinista diríamos: é como se alguém estivesse a bordo dum navio, e levasse um tombo; contudo está a bordo ainda; não caiu ao mar.
Mas o Novo Testamento ensina, sim, que é possível resistir à graça divina e resistir para a perdição eterna (Jo 6.40; Hb 6.6; 10.26-30; 2Pe 2.21; Hb 2.3; 2Pe 1.10), e que a perseverança é condicional dependendo de manter-se em contacto com Deus.
Note-se especialmente Hb 6.4-6 e 10.26-29. Essas palavras foram dirigidas a cristãos; as epístolas de Paulo não foram dirigidas aos não-regenerados. Aqueles aos quais foram dirigidas são descritos como havendo sido uma vez iluminados, havendo provado o dom celestial, participantes do Espírito Santo, havendo provado a boa Palavra de Deus e as virtudes do século futuro. Essas palavras certamente descrevem pessoas regeneradas.
Aqueles aos quais foram dirigidas essas palavras eram critãos hebreus, que, desanimados e perseguidos (10.32-39), estavam tentados a voltar ao Judaísmo. Antes de serem novamente recebidos na sinagoga, requeria-se deles que, publicamente, fizessem as seguintes declarações (10.29): que Jesus não era o Filho de Deus; que seu sangue havia sido derramado justamente como o dum malfeitor comum; e que seus milagres foram operados pelo poder do maligno. Tudo isso está implícito em Hb 10.29.
Antes de sua conversão havia pertencido à nação que crucificou a Cristo; voltar à sinagoga seria de novo crucificar o Filho de Deus e expô-lo ao vitupério; seria o terrível pecado da apostasia (Heb. 6.6); seria como o pecado imperdoável para o qual não há remissão, porque a pessoa que está endurecida a ponto de cometê-lo não pode ser "renovada para arrependimento"; seria digna dum castigo mais terrível do que a morte (10.28); e significaria incorrer na vingança do Deus vivo (10.30, 31).
VI - O EQUILÍBRIO EVITA OS EXTREMOS
Quando duas doutrinas bíblicas são colocadas em posição antagônica (oposta), uma contra a outra, o resultado é uma reação que conduz ao erro. Por exemplo: a ênfase demasiada à soberania e à graça de Deus na salvação pode conduzir a uma vida descuidada, porque se a pessoa é ensinada a crer que conduta e atitude nada têm a ver com sua salvação, pode tornar-se negligente. Por outro lado, ênfase demasiada sobre a livre vontade e responsabilidade do homem, como reação contra o Calvinismo, pode trazer as pessoas sob o jugo do legalismo e despojá-las de toda a confiança de sua salvação. Os dois extremos que devem ser evitados são: a ilegalidade e o legalismo.
- É inevitável defrontarmo-nos com mistérios quando nos propomos tratar as poderosas verdades da presciência de Deus e a livre vontade do homem; mas se guardamos as exortações práticas das Escrituras, e nos dedicamos a cumprir os deveres específicos que se nos ordenam, não erraremos. "As coisas encobertas são para o Senhor Deus, porém as reveladas são para nós" (Dt 29.29).
O Novo Testamento ensina uma verdadeira "segurança eterna", assegurando-nos que, a despeito da debilidade, das imperfeições, obstáculos ou dificuldades exteriores, o cristão pode estar seguro e ser vencedor em Cristo. Ele pode dizer com o apóstolo Paulo: "Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, ou a angústia, ou a perseguição ou a fome, ou a nudez, ou o perigo, ou a espada? Como está escrito: Por amor de ti somos entregues à morte todo o dia; fomos reputados como ovelhas para o matadouro. Mas em todas estas coisas somos mais do que vencedores, por aquele que nos amou. Porque estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor" (Rom. 8.35-39).
CONCLUSÃO
Faz alguns anos, um ministro escocês, um verdadeiro homem de Deus, se inclinou no púlpito, no início do seu sermão e disse em tom solene:
– Meus amigos, tenho uma pergunta a fazer-lhes. Eu não posso respondê-la e nem tampouco vocês. Nem um anjo do Céu, nem o diabo a responderia.
Um silêncio fúnebre reinou na congregação. Todos os olhares fixavam-se no pastor, que prosseguiu, dizendo:
– A pergunta é esta: "Como escaparemos, se rejeitamos tão grande salvação?" - C. H. Spurgeon.
HENRY, Matthew. Comentário Novo Testamento, CPAD.
PEARLMAN, Myer. Conhecendo as Doutrinas da Bíblia – Editora Vida, 2006.
THIESSEN, Henry Clarence. Palestra em Teologia Sistemática, Ed. Batista Regular. São Paulo, 1997.
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